Autor: Andre Vidal (Head Óleo, Gás e Materiais Básicos), Guilherme Nippes (Analista de Óleo & Gás e de Materiais Básicos) e Helena Kelm (Analista de Óleo, Gás e Materiais Básicos)
01/03/2023 01:24:44 • Atualizado em 01/03/2023 08:59:28
“Nada é certo, exceto a morte e os impostos”
Ontem, o governo anunciou uma medida provisória, com prazo de quatro meses, com recomposição parcial dos tributos federais, a partir de amanhã, para gasolina e etanol, e também um imposto de exportação de 9,2% para o petróleo bruto. Esperamos uma reação feroz das empresas de petróleo e gás nos próximos quatro meses contra esta proposta nos debates do congresso, enquanto o governo tentará todos os esforços para mudar a política de PPI da Petrobras (uma tarefa nada fácil e nem rápida). Acreditamos que a percepção de risco para investir em ações de petróleo e gás (O&G) no Brasil aumentou ontem, mesmo que os impostos de exportação não se tornem permanentes nos próximos quatro meses. No entanto, vimos que uma grande parte (~40%) dos efeitos de perpetuidade de um imposto de exportação de petróleo de 9,2% já foram precificados ontem.
A famosa afirmação de Benjamin Franklin no início desse conteúdo certamente se aplica ao Brasil, embora se possa pensar que as palavras “certos”, “impostos” e “Brasil” em uma frase não parecem se encaixar. As recentes discussões governamentais sobre quando e como restabelecer os impostos sobre a gasolina e o etanol, e as consequências para o setor brasileiro de petróleo e gás, são um exemplo disso.
O que está acontecendo?
No segundo semestre de 2022, o governo brasileiro implementou reduções de impostos sobre combustíveis, solicitando isenção de impostos federais, até o final do ano, para vários produtos (principalmente, PIS/COFINS sobre diesel e gasolina e CIDE para gasolina). Em janeiro de 2023, o novo governo publicou uma medida provisória estendendo as isenções do PIS/COFINS do diesel e GLP até o final do ano e da gasolina e etanol até 28 de fevereiro de 2023. A isenção da CIDE do diesel foi instituída em 2018 sem prazo definido data de validade.
Entre a espada e a cruz
Com a aproximação do dia da restituição dos impostos da gasolina e do etanol, a mídia noticiou várias discussões dentro do governo sobre o que fazer: restaurar os impostos (elevando a inflação e prejudicando a popularidade do governo) ou estender a isenção (com forte impacto fiscal). A devolução integral do PIS/COFINS da gasolina significaria um aumento de R$ 0,70/L (+13%) e do etanol de R$ 0,24/L (+6%).
Petrobras para o resgate?
A julgar por algumas notas da mídia e declarações de membros do governo, a vontade do presidente Lula seria usar a Petrobras para extinguir o preço de paridade de importação (“PPI”) para reduzir o preço na porta da refinaria, eliminando assim os efeitos finais para os consumidores sobre os preços da gasolina na bomba após a restituição dos impostos. No entanto, como temos dito há algum tempo, para a Petrobras não é fácil nem rápido extinguir o PPI.
Salvo pelo gongo? No entanto, o governo parece ter sido auxiliado por fatores externos, pois os preços internacionais do diesel e da gasolina caíram, permitindo à Petrobras anunciar uma redução nos preços da gasolina (R$ 0,13/L) e do Diesel (R$ 0,08/L). Considerando este anúncio, agora vemos preços bastante próximos do PPI (ver figuras abaixo). No entanto, a alta volatilidade dos preços internacionais da gasolina e do diesel (sem contar da cotação do real) pode fazer com que esse quadro mude muito rapidamente.
Uma restauração parcial dos impostos
Ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, concederam entrevista coletiva e anunciaram medida provisória, com prazo de quatro meses, com recomposição parcial de tributos federais a partir de hoje: R$ 0,47/L para gasolina (parcialmente compensado pela redução de R$ 0,13/L para o preço da Petrobras equivale a um aumento líquido de R$ 0,34/L) e R$ 0,02/L para o etanol. Diesel, GLP e querosene de aviação permanecem com zero impostos federais até o final de 2023. Ausente de novas ocorrências, em quatro meses, os impostos federais sobre gasolina e etanol serão totalmente restabelecidos.
A conta foi estendida ao setor. Como os impostos não foram totalmente restabelecidos, o governo federal criou uma nova fonte de receita para custeá-lo: os impostos sobre as exportações de petróleo bruto. A referida medida provisória instituiu 9,2% de tributos sobre a exportação da commodity. Em 2022, o Brasil exportou ~500mn de bbls (~1,35kbbl/d). A Petrobras não é uma grande exportadora de petróleo bruto (~0,51kbbl/d em 2022, ou ~40% do total das exportações brasileiras) porque a maior parte é consumida internamente em suas refinarias. Assim, outras empresas brasileiras e internacionais de O&G pagarão, proporcionalmente, uma fatia maior dessa conta do que a Petrobras. Considerando 125mn bbls, a ~US$ 80/bbl preço de venda, 5,2 BRL/USD, e 9,2% de taxa de imposto, chegamos a R$ 4,8 bilhões de faturamento nestes quatro meses (um pouco abaixo das estimativas do Sr. Haddad, de R$ 6,6 bilhões).
Um medo se torna realidade. Já falamos isso há algum tempo, mas vimos risco político não só para a Petrobras, mas também para as empresas Jr O&G sob nossa cobertura (por temores de aumento de tributação no setor). Por isso recomendamos exposição a ações internacionais de O&G e até na própria commodity (para quem tem mandato para isso, pois também temos presenciado mais tributação para empresas de O&G em outras jurisdições). Ontem o setor teve forte liquidação: PRIO3 -9%, RRRP3 -7%, RECV3 -6%, PETR4 -3,5%. Fora isso, ontem poderia ter sido um dia positivo para a 3R, após a aprovação da ANP sobre a aquisição da Potiguar (o Ibama agora é a etapa final necessária para fechar a aquisição, movimento que vemos como um passo muito importante para reduzir o risco do case).
O que vai acontecer nos próximos 4 meses?
Para as empresas de O&G no Brasil, acreditamos que isso desencadeará uma corrida para armazenagem, pois as empresas tentarão adiar ao máximo as exportações, esperando que esses impostos não se tornem permanentes (o que pode frustrar as expectativas do governo em relação às receitas). A PRIO provavelmente sofrerá mais (embora nosso entendimento inicial seja que o petróleo armazenado no Caribe já foi exportado e, portanto, não está sujeito a esse imposto de 9,2%), seguido pela Petrobras e com impactos moderados para 3R ou Petroreconcavo. No entanto, não é um trimestre de impostos que muda a agulha para os investidores: é a percepção dos riscos que estão por vir.
“Impostos temporários” no Brasil raramente são … temporários. Se o Brasil acabar com impostos permanentes de exportação de petróleo bruto, ao longo do tempo, acreditamos que o preço interno também será afetado: como o Brasil é um exportador líquido de petróleo bruto (exportações líquidas/produção é de aproximadamente 40%), os preços internos tendem a seguem a paridade de preços de exportação – “PPE” (embora o domínio da Petrobras sobre a produção e o consumo de petróleo possa distorcer isso). Então, no final, achamos que os preços de venda do petróleo podem ser afetados para todas as empresas Jr O&G sob nossa cobertura. A tabela na próxima página apresenta nosso target-price (“TP”) considerando 3 cenários (todos com preços internos de petróleo baseados em PPE): (i) sem impostos de exportação (caso base sob nosso TP oficial); (ii) com receitas petrolíferas 9,2% inferiores até 2026, e; (iii) Receitas de petróleo 9,2% menores até a perpetuidade. Conforme dito anteriormente, devido ao consumo interno nas refinarias, a Petrobras é menos afetada. A Petroreconcavo também é proporcionalmente menos afetada devido ao maior mix de vendas de gás. O 3R acaba por perder mais valor do que o PRIO devido à sua rentabilidade inferior. A julgar pelas reações dos preços de ontem, podemos dizer que ~40% do cenário de perpetuidade já estava embutido nos preços das ações.
Uma proposta perde-perde?
Em entrevista coletiva, Silveira afirmou que via as taxas de exportação de petróleo bruto como um mecanismo de incentivo aos investimentos em refinarias no Brasil. Em teoria, um preço mais baixo do petróleo bruto aumenta o crack spread e, portanto, a lucratividade de uma refinaria, tudo o mais igual. O problema é que o movimento de ontem muda outras variáveis, principalmente na percepção de risco. Portanto, não concordamos com a visão do Sr. Silveira de que esse imposto deveria impulsionar os investimentos nas refinarias. Por outro lado, mais impostos para o petróleo (em um setor já fortemente tributado) atuam como um mecanismo para menores investimentos em exploração & produção (assim, afetando as receitas do governo a longo prazo e reduzindo o PIB potencial do Brasil).
O que esperar à frente?
Esperamos uma reação feroz das empresas de petróleo e gás nos próximos quatro meses contra esta proposta, nos debates que irão ocorrer no congresso. Acreditamos que o argumento de menos investimento em E&P pode pesar na decisão do governo. Enquanto isso, vários membros do governo continuam alegando que a política de PPI da Petrobras é a culpada. Essa política vai mudar quando o governo eleger uma novo CA e diretoria para a estatal? Acreditamos que mais passos serão necessários: principalmente mudanças na “Lei das Estatais” (13.303) e no Estatuto da Petrobras (o que provavelmente provocaria reações de minoritários e discussões na CVM sobre o debate de “abuso de poder de controle” x “interesse público” nas empresas estatais no Brasil).
O que fazer agora?
Acreditamos que a percepção de risco para investir em ações de petróleo e gás no Brasil aumentou após os eventos de ontem, mesmo que os impostos de exportação não se tornem permanentes nos próximos quatro meses. No entanto, vimos que uma grande parte (~40%) dos efeitos de perpetuidade de um imposto de exportação de petróleo de 9,2% já foram precificados ontem. Por enquanto, mantemos nossos preços-alvos (TP) inalterados. Como antes, continuamos gostando de uma estratégia de igual peso entre as 3 juniores sob nossa cobertura, mas agora, ainda mais do que antes, gostamos de diversificar a exposição de O&G com outras ações no exterior e na própria commodity.
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Fonte: conteudos.xpi
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