Autor: Tiago Sbardelotto (Economista da XP)

10/11/2022 11:23:53 • Atualizado em 10/11/2022 11:31:22

Expansão das despesas no próximo ano impactará significativamente a trajetória da dívida pública. Definição de nova regra fiscal será fundamental para ancorar expectativas sobre sustentabilidade fiscal.

As atenções nesta semana se voltam para a apresentação da proposta de emenda constitucional (PEC) que institucionaliza um “waiver” para realizar gastos acima do limite imposto pelo teto de gastos ou retirar as despesas com o Auxílio-Brasil do teto de gastos, a chamada PEC da transição. Nesta nota, avaliamos os possíveis cenários para a PEC diante das possíveis escolhas do novo governo para a ampliação de gastos.

Mudanças de despesas têm caráter permanente. Embora tenha se adotado comumente o termo “waiver” como sinônimo de uma mudança temporária, as despesas que se pretende incluir no orçamento – elevação do Auxílio-Brasil a R$ 600, adicional de R$ 150 para crianças menores de 6 anos, recomposição de despesas correntes, entre outras – têm caráter permanente. De fato, a mudança temporária nesse caso se refere à regra do teto, que deve ser revogada e substituída por outra regra fiscal a partir do próximo ano. Mas essa nova regra já deve incluir a elevação de despesas que se propõe agora.

Tamanho da elevação das despesas importa… Considerando-se um cenário base de redução do ritmo de crescimento da economia no próximo ano e de manutenção da taxa de juros nos atuais patamares até o início do segundo semestre, a continuidade teto de gastos em seu desenho atual levaria a uma leve alta da relação DBGG/PIB no ano que vem, mas a uma redução até o final desta década. Se considerarmos uma elevação em montantes de R$ 100 bilhões (1% do PIB), a trajetória da dívida mostra um crescimento superior em 7,8 pp ao final do período, acima do que se projeta para 2022 portanto. No caso de uma alta de R$ 175 bilhões, como tem sido divulgado, a dívida deve subir até 14,2 pp. ao final da década em relação ao cenário do teto inalterado, findando em patamares acima dos verificados inclusive em 2020, ano da pandemia.

…Assim como nova regra a partir de 2024. Como apontamos, o “waiver” atual deve ser sucedido de uma discussão, a partir do próximo ano, de uma nova âncora fiscal. Ainda não há qualquer indicativo de como será esse desenho, mas a princípio pode-se inferir que a manutenção da regra de correção do salário-mínimo acima da inflação deve impor um crescimento da despesa total também acima da inflação. De todo modo, a combinação de uma alta de até R$ 175 bilhões nas despesas neste ano e um crescimento acima da inflação nos próximos anos deve resultar em uma trajetória de elevação da dívida até o final do período, sem perspectivas de estabilização. Nossa simulação aponta que, com um crescimento real de 2%, a dívida pública seria 9,2 pp. acima do cenário de crescimento apenas em linha com a inflação em 2030, chegando a um patamar próximo a 100%.

Retirada de despesas do teto é risco adicional. Uma possibilidade que tem sido aventada nos últimos dias é excluir o programa Auxílio-Brasil do teto de gastos de forma permanente. Em termos fiscais, o impacto em 2023 é semelhante, mas a medida embute o risco adicional de que o programa seja expandido sem qualquer balizamento a partir de 2024, o que levaria a uma deterioração adicional do cenário. Há também risco do lado da receita se houver cumprimento da promessa de isenção do IRPF a partir de R$ 5000 mensais, o que pode aumentar em 1,2 pp. do PIB apenas em 2023.

Perspectiva de insustentabilidade fiscal pode afetar juros e câmbio. Avaliamos que o tamanho da expansão fiscal combinada uma regra pouco restritiva de elevação de despesas deve impactar juros e câmbio e tornar o trabalho do Banco Central em controlar a inflação mais difícil, com manutenção da taxa de juros em patamares mais altos por um tempo maior. Dessa forma, será fundamental aguardar os próximos passos, especialmente as indicações de como o novo governo financiará a elevação de despesas.

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Fonte: conteudos.xpi


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