Autor: Tatiana Nogueira (Economista da XP) e Caio Megale (Economista-chefe da XP).
01/08/2022 11:58:48 • Atualizado em 01/08/2022 12:56:15
Destaques
- Os dados desde o último Copom sugerem uma perspectiva de inflação mais equilibrada, embora ainda desafiadora. Os riscos de recessão global aumentaram, o que contribui para diminuir pressões inflacionárias. Porém, a inflação de serviços mantém-se em níveis elevados – sem qualquer sinal de acomodação – e o mercado de trabalho vêm se mostrando bem aquecido;
- Nossas simulações replicando o modelo do Copom apontam queda da projeção do IPCA de 2022 de 8,8% para 7,0%; alta em 2023 de 4,0% para 4,6%; e ligeira queda em 2024 de 2,7% para 2,6%;
- Esperamos alta de 0,5pp na taxa Selic nesta reunião. Acreditamos que o Copom deixará a porta aberta para parar ou continuar em setembro. A incerteza fiscal é o principal risco para a inflação no horizonte relevante.
Hawk-Dove Heatmap: risco de recessão global torna perspectiva de inflação mais equilibrada, embora ainda muito desafiadora
Desde a última reunião do Copom, os riscos de recessão global aumentaram. Os indicadores econômicos nos EUA e na Europa estão desacelerando e os preços das commodities apagaram boa parte dos ganhos de 2022.
Considerando que parte relevante das pressões inflacionárias brasileiras é global, é uma boa notícia para o Copom.
As últimas leituras do IPCA começam a revelar queda na inflação de bens industrializados, possivelmente resultado de uma combinação das menores pressões globais mencionadas acima com alguma desaceleração na demanda doméstica.
No entanto, a inflação de serviços mantém-se em níveis muito elevados, sem qualquer sinal de acomodação. Um mercado de trabalho mais forte do que o esperado sugere que essa tendência será difícil de ser revertida.
As expectativas de inflação continuam em alta, o que também representa um desafio para a política monetária. Há um viés de alta em nossa inflação de preços administrados para 2023, principalmente em planos de saúde. Se confirmado, a projeção do IPCA de 2023 ficaria ainda mais distante do limite superior da meta (em torno de 5,5%, ante 4,75% do topo da banda de tolerância).
Por último, mas não menos importante, o Congresso aprovou a Emenda Constitucional que permite um aumento substancial das despesas acima do teto este ano. E quase não há clareza sobre qual será o arcabouço fiscal a partir de 2023. Este parece o principal risco para a inflação no horizonte relevante do Copom.
Considerando tudo, acreditamos que a entrada de dados desde a última reunião do Copom tornou a perspectiva de inflação brasileira mais equilibrada, embora ainda muito desafiadora e cercada de incertezas.
Modelo do BCB: projeção mais alta em 2023 e leve recuo em 2024
Na última reunião do Copom, as projeções de inflação no cenário de referência do BC eram de 8,8% para 2022, 4,0% para 2023 e 2,7% para 2024.
Desde a última reunião do Comitê, as medianas das projeções da taxa Selic na pesquisa Focus subiram de 13,25% para 13,75% em 2022 (final do período), de 10,00% para 11,0% em 2023 e 7,5% para 8,0% em 2024, em 7,5%. A taxa de câmbio se desvalorizou para R$/US$ 5,30, partindo de R$/US$ 4,90 em junho. As expectativas de inflação, também da pesquisa Focus, caíram de 8,5% para 7,2% para 2022, subiram de 4,7% para 5,3% em 2023 e permaneceram estável em 3,3% em 2024.
A depreciação do câmbio elevou a projeção do IPCA, enquanto queda do preço de commodities, política monetária mais apertada e expectativas contribuíram para a queda do número. O efeito líquido sobre a inflação de preços livres em 2022 (75% do IPCA) é de +0,11pp (vide tabela), segundo nossos cálculos. A previsão para a inflação de preços administrados (25% do IPCA) deve cair significativamente este ano, de 7,0% para -0,6%, com efeito da queda de ICMS sobre preços de energia, combustíveis e telefonia fixa.
Tudo considerado, a projeção para o IPCA de 2022 no cenário de referência deve cair de 8,8% para 7,0%.
Para 2023, estimamos que a projeção suba para 4,6%. Embora com contribuição negativa da inércia de 2022 e maior aperto monetário, o aumento das expectativas na pesquisa Focus, e câmbio mais depreciado, contribuem para essa elevação. Além disso, com retorno da tributação de impostos federais sobre gasolina e etanol, inflação de bens administrados também deve se elevar.
Desde junho, o Copom passou a incluir também as projeções para 2024. Esperamos recuo de 2,7% para 2,6% na projeção para aquele ano.
Implementação de Política Monetária e Comunicado: a espera dos dados
Considerando o substancial ajuste monetário já implementado, a comunicação do Copom e a perspectiva de uma recessão global que pode reduzier as pressões inflacionárias, acreditamos que o Copom está se aproximando de um momento de “parar para ver”.
Assim, acreditamos que o Comitê fará o aumento esperado de 0,50pp esta semana, mas não se comprometerá mais com outro aumento na próxima reunião. O cenário desafiador, no entanto, não permite que o Copom anuncie que está interrompendo o ciclo agora.
Um comunicado pós-decisão tornando a política monetária contingente aos dados que virão até a próxima reunião poderia ser assim:
Cenário XP: pausa agora, com grande risco fiscal adiante.
Com as pressões inflacionárias globais começando a diminuir, acreditamos que o Copom finalmente fará a pausa que vem sinalizando há algum tempo. Em nosso cenário básico, o Copom eleva a Selic em 0,50pp esta semana e a mantém a taxa Selec em 13,75% até meados do ano que vem.
Reconhecemos, porém, que o Comitê pode optar por ir um pouco mais longe, para garantir que o IPCA recue adiante.
Em circunstâncias normais, o Copom deve encontrar espaço para a flexibilizar a política monetária no ano que vem. As taxas de juros reais (considerando as expectativas de inflação) estão próximas de 8%, o que é muito alto mesmo para padrões brasileiros. Especialmente após importantes reformas estruturais aprovadas nos últimos anos, como a Previdência, a TLP, a independência do Banco Central, entre outras.
No entanto, não estamos em circunstâncias normais. Como mencionado acima, quase não há clareza sobre qual será o arcabouço fiscal a partir de 2023. Uma mudança mais profunda e permanente na política fiscal, que torne ainda mais nebulosas as perspectivas de sustentabilidade da dívida, pode alterar completamente os parâmetros da política monetária nos próximos anos.
Este parece ser o principal risco para a inflação no horizonte relevante de política monetária.
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Fonte: conteudos.xpi
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